Assistir aos jogos olímpicos pode ser uma grande oportunidade de aprendizagem, especialmente se trazermos para o cotidiano e para a realidade de nós simples mortais o que os atletas e os medalhistas fizeram por lá.
Destaco duas cenas que me marcaram muito.
Cena 1: Epke Zonderland, o Holandês que ganhou a medalha de ouro na barra fixa, brilhantemente.
Aqui a final com os 8 classificados:
(É preciso seguir o link e assistir no YouTube porque o vídeo é do Comitê Olímpico Internacional
e possue direitos autorais...)
Vale à pena assistir; tem 32 minutos e é exuberante. De ótima qualidade.
http://www.youtube.com/watch?v=I0TM2sOnvyI
Aqui o desempenho dele:
Cena 2
A sul-coreana Lam Shin foi prejudicada pelo cronômetro, que teria parado ou tido uma pane e recusou-se a sair da área de combate. Ela fez um protesto silencioso e choroso pela injustiça, no melhor estilo Ghandi. Segundo uma tradição desse esporte, abandonar a área de combate é admitir e reconhecer a derrota.
Como ela poderia admitir reconhecer a derrota para a tecnologia?
Perder para um relógio?
Cenas 3. 4. 5 e adiante.... : As nossas (possíveis) aprendizagens
Um lindo paradoxo está colocado nessas duas cenas e que nos remete a pensar nas nossas vitórias e derrotas.
Antes de Epke conseguir essa performance nas barras, ele treinou anos - anos - e caiu - caiu - e errou incontáveis vezes...e nós nos incomodamos e nos irritamos quando uma coisinha não dá certo na primeira tentativa! Que espanto!
Para chegar a perfeição...precisamos de muitas - muitas -coisas.
Quantas derrotas ele teve? Quantas para o aparelho? E os tombos? E o desânimo que pode ter se apoderado dele nesses momentos?
Quantas vezes ele buscou forças, coragem, disciplina e seguiu adiante? Quantas?
Acho que nem ele próprio sabe.
E a Lam Shin?
Como estaria o estado psicológico dela naquele momento? Teria surtado? Teria "feito" uma crise depressiva?
Não importa: isso é secundário.
O que importa é a recusa em aceitar uma derrota desse tipo.
E protestar.
A capacidade de indignar-se com o que consideramos injusto e demonstrar esse sentimento é condição de existência e até mesmo de saúde.
Quantas vezes nos submetemos às injustiças e aos mal-tratos e nem sequer choramos (duros de orgulho, de falsa sensação de poder, de invulnerabilidade)? Engolimos em seco e fazemos de conta que não é conosco.
Atrasam as consultas, desrespeitam o trânsito, ligam-nos no final de semana para vender produtos... e...
e?
E querem nos fazer crer que a tecnologia tem SEMPRE razão.
Vínculos são prejudicados e grandes problemas ocorrem em decorrência de uma mensagem de texto não recebida dum celular (mas que o visor do aparelho do emitente garante ter sido enviada). Mas que o receptor não recebeu?
E os pagamentos que efetuamos e que não "constam no sistema"?
E as contas indevidas que nos são enviadas - e até cobradas - sem terem sido, jamais, os produtos a elas ligados, solicitadas?
Essa sul-coreana nos faz pensar sobre o que é derrota.
O que é derrota?
Terá sido ela derrotada? Pela máquina que supostamente falhou?
Ou terá sido ela derrotada pela complexidade que envolveu a cena? Complexidade que incluiu a tecnologia e os usos que se faz dela, os juízes, o tempo, a necessidade de definição "de quem afinal ganhou a luta" e seguir com as provas que estavam programadas...
Que derrota é essa, se ela se saiu tão vitoriosa na sua dignidade e na sua manifestação, a ponto de contagiar milhões de pessoas que ficaram solidárias a ela?
Oh sim: ela perdeu a medalha. E perdeu para a tecnologia.
Mas ganhou - e muito - em todos os outros sentidos.
Uma derrota que é uma derrota.
Uma derrota que é uma vitória (ou várias)!
E, voltando ao Epke:
Uma vitória que é uma vitória.
E... uma vitória que foi feita de muitas derrotas anteriores.
Um lindo paradoxo.
Meus parabéns para eles e meu muito obrigado por me fazerem (re)lembrar disso.
Eles são feras.
Cada um do seu jeito.