30 novembro, 2008

Quando o terremoto passar...




(Céu em Mumbai, Índia - foto da web)


Dizem que passado o terremoto de Lisboa (1755),
o Rei perguntou ao General o que
se havia de fazer.
Ele respondeu ao Rei:
'Sepultar os mortos,
cuidar dos vivos e fechar os portos'.

Essa resposta simples,
franca e direta tem muito
a nos ensinar.

Muitas vezes temos em nossa vida
'terremotos' avassaladores,
o que fazer?
Exatamente o que disse o General:
'Sepultar os mortos,
cuidar dos vivos e fechar os portos'.

E o que isso quer dizer para a nossa vida?

Sepultar os mortos significa que não adianta
ficar reclamando e chorando o passado.
É preciso 'sepultar' o passado.
Colocá-lo debaixo da terra.
Isso significa 'esquecer' o passado.
Enterrar os mortos.

Cuidar dos vivos significa que,
depois de enterrar o passado,
em seguida temos que cuidar do presente.
Cuidar do que ficou vivo.
Cuidar do que sobrou.
Cuidar do que realmente existe.

Fazer o que tiver que ser feito para
salvar o que restou do terremoto.

Fechar os portos significa não deixar as
'portas' abertas para que novos
problemas possam surgir ou
'vir de fora' enquanto estamos
cuidando e salvando o que restou
do terremoto de nossa vida.
Significa concentrar-se na reconstrução,
no novo.

É assim que a história nos ensina.
Por isso a história é 'a mestra da vida'.
Portanto,
quando você enfrentar um terremoto,
não se esqueça:
enterre os mortos,
cuide dos vivos e feche os portos.




(Céu de Mumbai, Índia - foto da web)

Namoro de menininho





NAMORO DE MENININHO

Queria te namorar...
Meu Deus, como eu queria...
Namoro de meninininho
Te olhando assim... com carinho,
No colo da fantasia.

Queria só conversar
e sussurrar bem baixinho
Que quando fico sozinho Olhando as ondas do mar,
O vento sopra baixinho
seu canto de passarinho
Que voa...tão menininho, no brilho do teu olhar.

Ah... eu queria te amar... e caminhar de mãos dadas
Dançando pela calçada, Sorrindo, sem dizer nada,
E cada estrela contando...
...e quando tu me abraçasses E ... ingênua, tu me beijasses...
Queria que tu ficasses
Feliz como eu...te... sonhando.

Ah... se eu pudesse voltar
Num tempo em que a poesia
Riscasse a folha vazia
Do verso mais verso sedutor...
Eu fecharia meus olhos
E, então, te namoraria
Ah, eu me aconchegaria no colo do teu amor.

E numa cidadezinha,
com música na pracinha Parquinho e roda-gigante...
Tu sabes o que eu faria ?
Um verso te ofertaria
Que eu mesmo declamaria
Feliz... num alto-falante.


Luiz Gilberto de Barros



Clarice e Fernando (Lispector e Pessoa)





A PERFEIÇÃO

O que me tranqüiliza
é que tudo o que existe,
existe com uma precisão absoluta.
O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete
não transborda nem uma fração de milímetro
além do tamanho de uma cabeça de alfinete.
Tudo o que existe é de uma grande exatidão.
Pena é que a maior parte do que existe
com essa exatidão
nos é tecnicamente invisível.
O bom é que a verdade chega a nós
como um sentido secreto das coisas.
Nós terminamos adivinhando, confusos,
a perfeição.


Clarice Lispector

......................................

Sossega, coração!
Não desesperes!
Talvez um dia, para além dos dias,
Encontres o que queres
porque o queres.
Então, livre de falsas nostalgias,
Atingirás a perfeição de seres.
Mas pobre sonho
o que só quer não tê-lo!
Pobre esperença a de existir somente!
Como quem passa a mão pelo cabelo
E em si mesmo se sente diferente,
Como faz mal ao sonho o concebê-lo!
Sossega, coração, contudo!
Dorme!
O sossego não quer razão nem causa.
Quer só a noite plácida e enorme,
A grande, universal, solente pausa
Antes que tudo em tudo se transforme.

Fernando Pessoa





Como é por dentro outra pessoa, por Fernando Pessoa





Como é por dentro outra pessoa

Como é por dentro outra pessoa
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo
Com que não há comunicação possível,
Com que não há verdadeiro entendimento.

Nada sabemos da alma
Senão da nossa;
As dos outros são olhares,
São gestos, são palavras,
Com a suposição de qualquer semelhança
No fundo.

Fernando Pessoa

(Créditos de edição Lenise Marques)



Comentário meu:

Sobre a alma do outro...

Chama-se identificação
por semelhança
ou
por
desemelhança...

No fundo.

E... na superfície.

Fragmentos sempre intempestivos de viver a vida como ela é...

Natal Anunciado



Sabem o que é legal de um Natal anunciado por uma amiga
como Cida no Orkut?
É que ele vem como um anúncio de alguém que possui intensa
ligação com as luzes, de dentro e de fora... e com a sua busca
permanente.

Acender as luzes para ascender às luzes!
Identificação, chama-se!
Identificação, chama-me!


E ainda, para destacar, ele, o Natal, não é, assim, anunciado
pelos papai-noéis midiàticos do Capitalismo Mundial Integrado,
CMI = termo do Feliz Guattari!








Esta é a minha imagem símbolo, que adotei desde o ano passado, para o Natal.
Um fractal (caus - transparente) imerso numa multidão de natureza verde
- e cores - a vida!
Acho simplesmente espetacular: 11!


28 novembro, 2008

As dez orações pela paz... são da humanidade!





ORAÇÃO HINDU PELA PAZ

Ó Deus, leva-nos do irreal para o real. Ó Deus, leva-nos da escuridão para a luz. Ó Deus, leva-nos da morte para a imortalidade. Shanti, Shanti, Shanti a todos. Ó Senhor Deus Todo Poderoso, que haja paz nas regiões celestiais. Que haja paz sobre a terra. Que as águas sejam apacentadoras. Que as ervas sejam nutritivas e que as árvores e plantas tragam paz a todos. Que todos os seres benéficos tragam-nos a paz. Que a Lei dos Vedas propague a paz por todo o mundo. Que todas as coisas sejam fonte de paz para nós. E que a Vossa paz possa trazer a paz a todos e a mim também.

ORAÇÃO BUDISTA PELA PAZ

Que todos os seres, de todos os lugares, afligidos por sofrimentos do corpo e da mente sejam logo libertados de suas enfermidades. Que os temerosos deixem de ter medo e os agrilhoados sejam libertos. Que o impotente encontre forças e que os povos desejem a amizade uns dos outros. Que aqueles que se encontram a ermo sem caminhos e amedrontados - as crianças, os velhos e os desprotegidos - sejam guiados por entes celestiais benéficos e que rapidamente atinjam a condição de Buda.

ORAÇÃO JAINISTA PELA PAZ

A Paz e o Amor Universal são a essência do Evangelho pregado por todos os Seres Iluminados. O Senhor disse que a equanimidade é o Dharma. Perdôo a todas as criaturas e que todas as criaturas me perdoem. Por todos tenho amizade e por nenhuma criatura inimizade. Saiba que a violência é a causa raiz de todas as misérias do mundo. A violência é de fato o nó que aprisiona. "Não ofenda nenhum ser vivo". Este é o caminho eterno, perene e inalterável da vida espiritual. Por mais poderosa que seja uma arma, ela sempre pode ser sobrepujada por outra; mas nenhuma arma pode ser superior à não-violência e ao amor.

ORAÇÃO MAOMETANA PELA PAZ

Em nome de Allah, o benéfico, o misericordioso. Graças ao Senhor do Universo que nos criou e distribuiu em tribos e nações, que possamos nos conhecer, sem desprezarmo-nos uns aos outros. Se o inimigo se inclina para paz, inclina-te tu também para a paz e confia em Deus, Cheios de Graça são aqueles que andam sobre a Terra em humildade e quando dirigimo-nos a eles dizemos "PAZ".

ORAÇÃO SIKH PELA PAZ

Deus nos julga segundo nossas ações, não de acordo com o traje que nos cobre: a verdade está acima de tudo, mas ainda mais alto está o viver em verdade. Saibam que atingimos a Deus quando amamos e a única vitória que perdura é aquela que não deixa nenhum derrotado.

ORAÇÃO BAHAI PELA PAZ

Seja generoso na prosperidade e grato na adversidade. Seja justo ao julgar e comedido ao falar. Seja uma luz para aqueles que caminham na escuridão e um lar para o forasteiro. Seja os olhos para o cego e um guia para os errantes. Seja um sopro de vida para o corpo da humanidade, orvalho para o solo do coração dos homens e seja a fruta da árvore da humildade.

ORAÇÃO SHINTOÍSTA PELA PAZ

Embora as pessoas que vivem do outro lado do oceano que nos rodeia, eu creio, sejam todas nossos irmãos e irmãs, porque há sempre tribulação neste mundo? Porque os ventos e as ondas se levantam no oceano que nos circunda? Desejo de todo coração que o vento logo leve embora todas as nuvens que pairam sobre os picos das montanhas.

ORAÇÃO DOS NATIVOS AFRICANOS PELA PAZ

Deus Todo Poderoso, Grande Polegar que ata todos os nós, Trovão que Ruge e parte as grandes árvores; Senhor que tudo vê até as pegadas do antílope nas rochas, aqui na Terra, Vós sois aquele que não hesita em responder a nosso chamado. Vós sois a pedra angular da Paz.

ORAÇÃO DOS NATIVOS AMERICANOS PELA PAZ

Ó Grande Espírito de nossos Ancestrais, elevo meu cachimbo a Ti. Aos teus mensageiros, os quatro ventos, e à Mãe Terra que alimenta seus filhos. Dê-nos a sabedoria para ensinar nossos filhos a amarem, respeitarem e serem gentis uns com os outros, para que possam crescer com idéias de paz. Que possamos aprender a partilhar as coisas boas que nos ofereces aqui na Terra.

ORAÇÃO PARSE PELA PAZ

Oramos a Deus pra erradicar toda a miséria do mundo: que a compreensão triunfe sobre a ignorância, que a generosidade triunfe sobre a indiferença, que a confiança triunfe sobre o desprezo e que a verdade triunfe sobre a falsidade.

ORAÇÃO JUDAICA PELA PAZ

Vamos subir a montanha do Senhor, para que possamos trilhar os caminhos do Mais Alto. Vamos forjar arados de nossas espadas e ganchos de poda com nossas lanças. Uma nação não levantará a espada contra outra nação - nem aprenderão a guerra novamente. E ninguém mais sentirá medo, pois isto falou o Senhor das Hostes.

ORAÇÃO CRISTÃ PELA PAZ

Benditos são os que fazem a paz, pois eles serão chamados Filhos de Deus. Pois eu lhes digo: ouçam e amem os seus inimigos, façam o bem aos que te odeiam, abençoem aqueles que te maldizem, orem pelos que te humilham.. Aos que te batem no rosto, ofereçam a outra face, e aos que te tiram as vestes, ofereçam também a capa. Dá aos que pedem, e aos que tomam teus bens, não os peça de volta. E façam aos outros aquilo que quiserem que os outros te façam.




Você é livre, por Roberto Shinyashiki






Tenho convicção de que algumas decisões estão na nossa mão. Podemos escolher de acordo com uma série de limites que regem a liberdade.
Podemos mesmo escolher com quem viver?
Podemos mesmo escolher sofrer ou parar de sofrer?
Podemos mesmo ser tão livres, como quer o papa da auto-ajuda Roberto Shinyashiki, a ponto de termos poder de vida e morte sobre as coisas da vida e o sofrimento que dela advém?
Será mesmo que tudo é tão simples e escolhível? Como escolher qual cor de camisa vou usar hoje... azul ou verde? Quem sabe... branca?

Esse texto, abaixo, está na contramão de tudo o que venho dizendo por aqui. No meu entender, essa liberdade que o referido autor prega, é uma ilusão vendida pela mídia do "querer é poder" e pelos vícios de querer subordinar a vida aos ditames do EU posso e Eu quero Egóicos.

Ora, a maior parte das coisas da vida, dentre elas, dor e o sofrimento, não estão na nossa mão e sob o nosso controle.
Distinguir as pessoas que estão no mundo entre as que querem viver e as que querem sofrer... é uma banalização simplista das muitas correntes de vida que atravessam nossos n estados emocionais, psíquicos e intelectuais.

É exatamente isso que Fuganti chama à atenção, no artigo sobre a moral e a ética: maneiras de transmitir... criam fatos tomados como realidade, por si só...

Muitos ao ler esse texto do Roberto acreditam, mesmo, que possuem semelhante poder de escolha. Banir o sofrimento através de uma atitude de escolha!!!
Poderia criar um slogan ou algo como palavras de ordem: abaixo o sofrimento!
Viva as escolhas!

Claro, penso eu, que é possível optar, em algumas situações, entre viver com a atenção no futuro, enfatizando a famigerada pré-ocupação... a centrar a atenção no presente e esperar o desenrolar dos fatos... uma espera feita de ação, não uma paralizia feita de acomodação!
Também penso que podemos, em n situações, suavizar e trazer alento para nossos cansaços e mal-estares do cotidiano.
Mas, daí a considerar que podemos optar sempre por não sofrer... vai uma grande diferença.

Párar de sofrer... ou, dito de outra forma, fechar o corpo e a mente às dores da alma, revela estreita conexão com o individualismo reinante e hegemônico que caracteriza a produção de subjetividade contemporânea.
Sorria... você está sendo filmado (não esqueça... é preferencial que seu sorriso seja bem claro, com todos os dentes e, ainda melhor do que isso ... que seus dentes sejam encapados com as mais novas descobertas de odonto-orto-estética.

Viva as aparências: desejo de imagem é tudo.

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Você é livre
Roberto Shinyashiki
(do livro "A Carícia Essencial")



Você tem o direito de escolher com quem,
e como vai viver.

Você pode mudar a sua vida.

Você pode estruturar a sua vida como quiser.

Porque você é livre.

Você é livre para sofrer tudo o que você quiser.

Perceba que sua liberdade lhe dá condições
para sofrer tudo o que você quiser.
Com uma simples cara fechada de seu marido resfriado,
você pode acabar numa crise conjugal de um mês.

Por causa de uma buzinada no trânsito,
você pode se irritar o dia inteiro.
Com a inflação do mês você entra em depressão profunda.

Porque você é livre.

Nada ou ninguém pode impedir
você de sofrer tudo o que quiser.
Perceba que nem mesmo muito dinheiro
pode impedir você de se sentir pobre.

Nem um grande amor pode impedir
você de se sentir mal amado.

Nem muitos amigos podem impedir
você de se sentir solitário.

Nem mesmo o sucesso pode impedir
você de se sentir fracassado.

Porque você é livre!

Você só vai parar de sofrer quando você quiser.
Perceba que é sua a opção pelo sofrimento.
Algumas pessoas decidem estar no mundo para viver,
outras para sofrer.

E pensam que é seu destino sofrer.
Isso é pura ilusão!

Só quando você decidir, você pára de sofrer.

Porque você é livre.



27 novembro, 2008

Ética como Potência e Moral como Servidão, por Luiz Fuganti







Ao primeiro sinal da palavra ética o que salta à atenção comum do cidadão é um chamado para que ele, ao ponderar seu sentido mais freqüente e ordinário, procure ascender a uma postura de vida e de comportamento que por princípio o colocaria no caminho do Bem, seja de natureza espiritual, seja um Bem para a humanidade ou, simplesmente, uma disposição por parte daquele que é qualificado com atributos ditos éticos, a assumir um comportamento que tenderia para o tão propalado bem comum da sociedade em que vive.

Bastaria, para isso, apenas seguir o referencial da Lei, com o ideal de igualar-se a sua pura forma e introjetar seu paradigma universal. Mas ao mesmo tempo em que esta concepção do senso comum é compartilhada como sendo a que melhor conduz o indivíduo a um modo de vida responsável e justo, concedendo-lhe o direito a uma espécie de liberdade assistida por fora e vigiada por dentro (como num panópticum ), relativa ao grau de liberdade que a própria sociedade poderia suportar sem ser ameaçada em sua constituição, instaura-se, na mesma proporção, a contraparte de um assujeitamento sutil e inaudito que submete e desvia tanto o desejo quanto mais ele adere, na espera de recompensas ou ganhos, ao modo moralmente útil de ser.

O modo que agrega o indivíduo ao corpo da sociedade, através de uma relação dicotômica de boa ou má vontade para com o corpo de leis, o qual devolve ao indivíduo o troco em forma de recompensas ou castigos, remonta já ao nascimento do Estado. Mas não é apenas o Estado arcaico que cultiva este tipo de código. Pertence a própria natureza do Estado este modo de codificar seus membros pela relação de obediência e transgressão. É por isso que o Estado é um grande estimulador e reprodutor das paixões tristes, como diz Espinosa. É por medo dos castigos e esperança das recompensas que o indivíduo submete-se a um poder que o separa da sua própria capacidade de agir e pensar livremente, desejando sua própria servidão. Ainda que aquele modo se alimente - por pura crença - de investimentos subjetivos de um indivíduo habituado ao esforço cotidiano de sobrevivência, dissimulando concórdias e inviabilizando relações reais de solidariedade ou - por pura conveniência utilitária e objetiva - de investimentos de desejo de poder) nem um pouco desinteressados (ao contrário do que invoca o sujeito legislador de Kant), desvela-se assim como seu contraponto um comportamento de um tipo de vida inteiramente subserviente, tragado por um círculo vicioso, como num buraco negro, sempre realimentado pela repetição da perda da capacidade de criar as próprias condições existenciais de efetuação de suas potências. É assim que tombamos. Por morder a isca dos "nossos" interesses, interesses de um "Eu", caímos cativos de uma moral que impõe dever a uma instância exterior como o Estado, o Bem, a Lei ou, em uma palavra, a valores de uma época que, apesar de serem criados por uma determinada sociedade historicamente formada, são publicados e estabelecidos como universais e perenes, enfim, transcendentes ao tempo e ao espaço nos quais emergiram.

Expressos por discursos que pretendem representar e justificar os chamados "bons costumes", autoqualificados de científicos, cultuados como verdades em si ou formas puras do saber, esses valores bloqueiam e separam o indivíduo de sua capacidade imanente de pensar e agir por ordem própria, desqualificando seus saberes locais e singulares como meras crenças ou opiniões e destituído-os de suas potências autônomas que criam seus próprios modos de efetuação. É dessa maneira que indivíduos tornados fracos, por paixões de medo e esperança passam a clamar por uma ordem heterônoma que os salvaria do caos, da impotência e da miséria, tal como no exemplo extremo do nazismo. Como diz Wilhelm Reich, os alemães não foram simplesmente enganados, eles desejaram o nazismo.

É de tais valores, aos quais uma suposta vontade humana deveria se curvar, que curiosamente se extrai uma significação intrínseca, a substância real, ao mesmo tempo forma em si e oriente para o Homem, para falar hegelianamente. Desenhando um plano de tal ordem transcendente à natureza material tida como caótica, o investimento em tais valores atribui à Lei a irônica tarefa e o crédito infinito de piedosamente salvar o Homem, já que, sobrevoando a natureza, estaria imune também às tendências perversas de uma natureza humana decaída, sempre em falta com o bem e a verdade, demasiado atolada nas paixões do corpo e da alma. É, portanto, nesse modo de instituir valores e vínculos que fundam-se dívidas infinitas e impagáveis, onde não sobra outra alternativa aos "cidadãos" senão rolar indefinidamente o principal da dívida e pagar interminavelmente seus juros. Eis como uma dívida de poder, por natureza impagável, se torna dívida de existência. Por esses bizarros caminhos é que se chega a desejar a própria sujeição como se da liberdade se tratasse. Quando queremos formar nossos cidadãos, investimos em assujeitamentos. Eis todo o cinismo da idéia moderna de liberdade.

Mas é a partir de modos de relações microfísicas de poder, imanentes ao próprio tipo de formação social, que se mostra realmente como se instaura e triunfa esse nihilismo, essa negação das qualidades nômades da vida, tornando as sociedades puramente reativas e conservadoras de uma maneira baixa de existir. Assim, a constituição da crença em formas metafísicas fechadas em si - que na verdade são geradas e cultivadas de dentro pelo próprio tipo de formação e desenvolvimento sociais - consolidaria um plano puramente transcendental, a partir do qual tudo o que acontece em sociedade poderia ser julgado, resgatado ou condenado. É sobre esse plano que geralmente a consciência ingênua é, simultaneamente, determinada e tornada cúmplice, pois corrobora verdades que toma como justas e neutras, eternas e externas, isto é, dotadas de uma transcendência que justificaria lógica e moralmente sua racionalidade legisladora. Numa espécie de coação de interesse mútuo, determinam-se as justas formas e prescrevem-se limites normativos como modelos autenticadores de idéias justas e de discursos unificadores, de atos equilibrados e de comportamentos responsáveis. No entanto, talvez a transposição mais sintomática deste processo moralizante apareça no ideal de unificação aspirado pelo poder, que se destaca e controla uma sociedade civil submetida aos seus interesses. Consequentemente, o poder produzirá o simulacro de uma conciliação, de um achatamento ou dissolução das diferenças.

Naturalmente, do ponto de vista político, a encarnação máxima da unificação se efetuaria na figura do Estado Nacional, sendo secundário o aspecto ideológico de sua bandeira, isto é, de quem o controla, operando invariavelmente a serviço do interesse privado ou parcial e em nome de um simulacro de conceito universal de coisa pública, sempre destacada da sociedade. O mais importante seria superar o estado de natureza, o qual, na visão de Hobbes, tende à discórdia, à dissolução e à guerra, para substituí-lo, na prática, por forças capazes de dominar, controlar e estancar a ferida das disputas individuais. É assim, por exemplo, que Hobbes concebe a ficção da unidade e da paz civil a partir de uma superação do estado de direito natural do homem, que alimentaria, na diversidade, a guerra de todos contra todos, para um estado de direito civil, onde o indivíduo delega parte de seus direitos naturais e recebe, em contrapartida, direitos de civilidade que lhe garantem a segurança, o desenvolvimento e a paz. Nesse sentido, o indivíduo submeter-se-ia a uma rede de direitos e deveres coextensivos a esta instância unificadora da sociedade, antes dividida e agora pacificada, a que se denomina Estado.

Para nós, toda essa visão da Lei, do Bem comum e da Obediência a um plano de organização de direitos e deveres que normatizariam as condutas e levariam a uma pretensa ordem universal, numa palavra, tudo o que constitui a atitude Moral propriamente dita na relação do indivíduo com a sociedade, precisa ser claramente distinguida de uma outra atitude, a postura a que chamamos Ética.

Contrariamente ao modo ascético e moral de ser, o modo de vida ético instiga, não a obediência a um conjunto de regras e valores prescritos pelo poder alheio, interiorizando formas e incorporando atitudes vindas de fora para podermos comungar das benesses do poder ou de vantagens que são, no final das contas, aguilhões. Não o modo de ser dos bons sujeitos legisladores guardiões do Juízo e da Lei abstrata, do Bem ou dos valores transcendente à vida cotidiana.

É a partir de outro lugar que não o da dominação e da sujeição, é a partir de um topos ocupado pela potência de afirmar as próprias diferenças constituintes dos seres ou ponto de vista da vida em processo de diferenciação, que o modo de vida ético se instala. O modelo da ética não é o do livre arbítrio para o Bem a partir da livre recusa do Mal. Bem e Mal são ficções fundadas numa mesma ilusão de consciência. E essa suposta liberdade nada mais é do que a ignorância das causas que determinam tal escolha ou recusa. A originalidade de Espinosa não consistiu em afirmar que o Mal, enquanto substância, não tinha realidade, mas justamente aquilo que o Ocidente mais cultuou: o próprio Bem, como substância do ser, também perdeu toda realidade. Mas, como diria Nietzsche, para além do Bem e do Mal não significa para além do bom e mau. Estes adjetivos qualificam agora não apenas atitudes e conseqüências, mas também e sobretudo tipos ou modos de vida, maneiras de existir. Mau é tudo aquilo que se serve das paixões tristes, da tristeza mesma para firmar e conservar seu poder ou separar as potências da vida de suas condições de afirmação, isto é, do que podem. Assim são maus, para Espinosa, não apenas o tirano que só consegue reinar sobre a impotência alheia, mas também o próprio escravo que alimenta a necessidade do tirano como seu provedor, bem como um terceiro tipo que vive da miséria dos dois e extrai dela um poder espiritual: o sacerdote. Eis a trindade do tirano, do escravo e do sacerdote, as três cabeças do ressentimento que estariam na base de todo poder. Sobre essa tríade, Epicuro, Lucrécio, Espinosa e Nietzsche dizem praticamente a mesma coisa. Denunciam tudo o que precisa da tristeza, da impotência e da miséria alheias para triunfar.

A ética, ao contrário, se funda num modo de viver sinalizado pela alegria. O problema ético parte da compreensão de que, como diria Espinosa, tudo na natureza participa de uma ordem comum de encontros. Bons e maus encontros, eis o objeto da problematização ética. Tudo se compõe e decompõe na natureza do ponto de vista das partes que a constituem. Assim, para explicar a natureza do mau, Espinosa lança mão de um modelo não moral, mas alimentar ou natural. O mau é sempre um mau encontro que, como a ingestão de um veneno, decompõe parcial ou totalmente os elementos que estão sob a relação característica que constitui o nosso ser existente e diminui ou destrói nossa potência de existir, agir e pensar, nos entristecendo ou matando. O bom seria como um alimento que se compõe com o nosso corpo constituindo um bom encontro, na medida que aumenta nossa potência de existir, de agir e pensar, produzindo consequentemente afetos de alegria.

Mas, como um alimento ou um veneno, nem tudo que é mau num momento, para um indivíduo, num determinado lugar, o é necessariamente se um dos elementos no encontro variar, como o lugar, o tempo, o indivíduo, corpo ou idéia. Desse modo, o que me envenena num tempo ou lugar, pode me alimentar noutro tempo ou lugar, bem como o que é alimento para um pode ser veneno para outro. O mau não é proibição, a não ser para o homem prisioneiro da consciência e da imaginação. O mau significa sempre um mau encontro que decompõe minha natureza por ignorar ou não partilhar suas leis; não leis humanas ou divinas promulgadas por um Senhor como palavras de ordem ou sentenças, mas leis da natureza que simplesmente nos fazem compreender o modo como a própria natureza funciona por si, a partir de si e para si e que nos afetam também na medida em que somos parte da própria natureza e agimos e pensamos por estas mesmas regras.

É, portanto, a partir de uma atitude bem diversa que se promove uma Maneira de Viver conforme critérios de conduta imanentes ao próprio ser do desejo, ser da vida, ser da sociedade, ser da natureza (tudo isso é uma e a mesma coisa no ser, não obstante sua distinção modal ou diferença de regime). Um conjunto de diferenças singulares livres não se deixa reduzir ou atrelar em relações contratuais, legais ou institucionais, as quais buscariam simplesmente silenciar os conflitos sociais ou deles extrair mais valia. Por não comportar mais a idéia de um indivíduo atomizado - cindido entre a impotência de afirmar e a obediência redentora - ou do eu pessoal - prisioneiro de atributos constituintes do sujeito como instância moral ou racional - o conceito de uma cidadania liberadora é pensado a partir de uma multiplicidade de singularidades como potências autônomas ou com tendência à autonomia. O campo social passa a ser compreendido ou constituído por um conjunto de forças em relação e não mais como um agregado de formas atomizadas, fechadas em limites morais e capturadas por valores utilitários ou finalistas. A vontade social torna-se propriamente plural, um autêntico campo de multiplicidades virtuais ou potências de atualização (com repulsa a unificações e fechamentos totalitários), torna-se verdadeiramente autônoma e aberta.

Como, enquanto cidadão, tornar-se uma potência pluralista, um agenciador de relações civis intensas e realmente solidárias ?

Tudo aquilo que por si só ou apenas a partir de si - de modo imanente - cria e condiciona modos de composição entre indivíduos e elementos que lhe atravessam, usando como critério seletivo do que se passa em sociedade a capacidade de afirmação e diferenciação, incorporada em cada acontecimento, constitui um filtro ou um plano de composição gerador de realidades livres, constitui um campo de atração e consistência como potência autônoma.

No mais profundo do nosso ser e na mais superficial das nossas superfícies de ser, somos não uma unidade ou identidade formal como um eu, mas multiplicidades singulares sem sujeito. No entanto, quanta potência, quanta diferenciação, quanta generosidade nesses modos próprios e singulares de ser ! Os laços que estabelecemos conosco, com outrem, com as multiplicidades sociais que se atualizam e nos afetam, enfim com a natureza, são catalizadores de acontecimentos, são condições de encontros e de transmissões de realidades, são o arco para flechas que trazem o futuro, mas que redimem o passado e fazem do presente um verdadeiro campo de experimentação e de produção inocente de realidade.

Somos potências individuantes que selecionam e extraem destes encontros ou relações o que realmente comunga na pura afirmação de tudo o que difere, criando singularidades intensificadoras da vida, como se atingíssemos um duplo do real em cada acontecimento, um real virtual que inflama a existência atual e acelera os processos que precipitam a geração do novo. Somos irredutíveis a formas médias de igualização. Participamos na afirmação, portanto, de diferenças criadoras que propiciam a expansão da vida em sociedade, superando limites que buscamos ultrapassar.

Chamamos ética não a um dever para com a Lei ou o Bem, nem tampouco a um poder de segregar ou distinguir o puro do impuro, o joio do trigo, o Bem do Mal, mas a uma capacidade da vida e do pensamento que nos atravessa em selecionar, nos encontros que produzimos, algo que nos faça ultrapassar as próprias condições da experiência condicionada pelo social ou pelo poder, na direção de uma experiência liberadora, como num aprendizado contínuo. Fazendo coexistir as diferenças, conectando-as ao acaso dos espaços e dos tempos que as misturam e tornam seus encontros, ao mesmo tempo, contingentes e necessários num plano comum de natureza adjacente ao campo social, (pois a vida não existe fora dos encontros e dos acontecimentos que lhe advém), afirmamos o que há de fatal nestes encontros, algo como o sentido superior de tudo o que é. Pois é querendo o acontecimento no próprio acontecimento, que liberamos algo que se distingue dos simples fatos cotidianos.

A apropriação e criação de regras e códigos que comandam a interpretação dos acontecimentos pelos intérpretes do poder, seja do ponto de vista político, econômico ou midiático, impõem o que se deve pensar, como se deve agir e em que ou quem acreditar, sob a guilhotina dos prêmios ou dos castigos por Bem ou por Mal, pelo útil ou nocivo, pelo legal ou ilegal, sempre conforme ao sentido dominante dado pelo poder em questão. A invenção dos fatos - ou do que deve ser destacado como histórico ou possuindo sentido relevante, como o que faz a notícia - é sempre dada no modo como o poder se apodera dos acontecimentos e lhes confere significado, na maneira como essa verdade é produzida pelo poder, a verdade do poder.

Encontramos algo diferencial dos fatos nos acontecimentos de uma sociedade e naquilo mesmo que nos acontece, pela simples razão de vivermos em sociedade, sendo capazes de experimentar por nós mesmos e apreender aquilo que constitui os acontecimentos, do mesmo modo que constituímos os acontecimentos. Tornamo-nos acontecimentos! Encontramos algo que duplica nossa experiência sensível e casual em vivência necessária e experiência do pensamento, isto é, algo como sentido ativo que nos leva a contrair e antecipar o futuro, ganhando velocidade e liberdade. Assim se constitui uma cultura nômade e uma memória virtual do futuro que nos distancia do presente cristalizado e faz fugir todo poder paralisador da vida. Através do sentido vivo em devir que não se deixa fixar ou capturar quando é rebatido sobre o plano dos fatos ou das significações dominantes do poder constituído.

Deste ponto de vista, como poder-se-ia formar autênticos agentes sociais, isto é, verdadeiros modificadores ou criadores de novas condições sociais de existência? Como formar cidadãos livres no pleno sentido da palavra ?

Como diria Nietzsche, sem o Não destruidor do leão, não geramos a condição para o grande Sim criador da criança instaurar uma roda que gira por si mesma, um novo começo, uma nova inocência. Por isso a necessidade da crítica. É preciso começar por denunciar as armadilhas que nos reservam os valores estabelecidos pelos poderes que se descolam e se voltam contra o campo social. Os Estados enquanto máquinas de submeter o conjunto das relações sociais, correspondem a investimentos que a própria sociedade faz para se manter coesa e que acabam voltando-se contra ela mesma.

Somos capazes de inventar outros modos de relações sociais ou estamos fadados ao tédio e à repetição do enfadonho ? Para responder esta questão, precisamos antes problematizar a natureza das relações que constituem o tecido atual das nossas sociedades e o modo como são reproduzidas. Somos prisioneiros de um "pré-conceito" ou de uma imagem que subjaz nas mais recônditas camadas da nossa história e do inconsciente coletivo e que coexiste no modo atual de transmitir conteúdos materiais, energéticos ou espirituais. Somos prisioneiros do mito que reza que toda relação social pressupõe uma troca concretizada por meio de um equivalente, isto é, por meio de um valor abstrato capaz de axiomatizar ou igualizar qualquer relação, destituindo-a de toda e qualquer singularidade que possa diferenciá-la e afirmá-la como um valor autônomo insubstituível. Assim, não só os produtos materiais transformaram-se em mercadorias. São todos os processos espirituais de singularizações e subjetivações humanas que caem na axiomática delirante do campo econômico - já que a axiomatização primeira é a do tempo - e que as reduzem todas a elementos com unidades mínimas equivalentes e permutáveis entre si. Não é o Dinheiro que constitui a forma privilegiada da mercadoria no capitalismo. É o modo de produção de subjetividade ou dos processos de subjetivação que constitui a condição fundamental geradora de todos os estofos ou substratos para a existência e a reprodução bem sucedida do próprio Capital.

A subjetividade é a mercadoria por excelência em nossas sociedades. Ela é a criação e a reprodução, pelo poder, de um território que não pára de faltar a si mesmo, alimentando assim a infindável insuficiência de ser: sempre preenchida pelo "poder" de compra, sempre frustrada pela ilusão insuperável do consumo ideal que escapa no instante mesmo em que o atingimos; sempre reproduzida em sua falta territorial, abismal carência, impotência real de conquista da moeda que tudo pode mas que sempre cava mais fundo, pela sua dupla face esquizofrênica, o buraco da dívida existencial. Fenda intransponível.

Estamos em novos ambientes. O capitalismo fabricou para si atmosferas ainda mais complexas. Como diria Deleuze, não mais a toupeira disciplinar, mas a serpente fluida do controle. A subjetividade já não é produzida simplesmente pelas velhas máquinas disciplinares. As máquinas a vapor e de carbono deram lugar às máquinas de silício, de terceira geração. O modus operandi do poder disciplinar, fechado e segmentarizado no tempo e no espaço, como descreveu Foucault, cedeu lugar para as cifras magnéticas que conectam ou desencaixam fluxos de energia em espaço aberto e controle ininterrupto.

Tanto o poder quanto a produção do seu estofo, a subjetividade, se realizam atualmente por modulação de fluxos sob controle aberto, infinitamente permutáveis e em comunicação permanente, como modo de produção de canais e mais valia de canais, de fluxos e mais valia maquínica, de idéias e mais valia de saber e poder. Controle num espaço tornado aberto simultaneamente no interior e no exterior e em velocidade absoluta no tempo que nos constitui como cifras simultaneamente comunicantes.

Não obstante, do mesmo modo que o poder tornou-se mais sutil com suas novas máquinas e formas de exercício, a vida, os devires ativos da vida também encontram ocasiões inéditas, inauditas e poderosas para reagir, criar, fazer passar o inesperado, o ar puro de novos devires e a potências de novas composições no seio mesmo de suas máquinas cibernéticas de controle.

A vida em última instância não se deixa trocar nem avaliar a partir de uma axiomatização abstrata das transmissões de energia. Pois é ela quem avalia e faz passar no modo da intensidade excedentes não mensuráveis, excessos pelos quais se torna possível a constituição de novos tipos de relações. Pois, na verdade, a natureza ou a própria vida, que é um modo de produção da natureza, é quem produz realidade e portanto, por esta capacidade de gerar o excesso, torna ao mesmo tempo possível e necessário novos modos de se relacionar em sociedade. Essas novas maneiras de ser ou modos de relação se caracterizam pela capacidade de fazer passar o excedente não codificável, as intensidades não mensuráveis, as quantidades de energia não axiomatizáveis.

Podemos fazer de nós mesmos um elemento sempre diferencial e diferenciante, gerador de novos devires, um agente imperceptível porque excêntrico e em mutação constante, senhor das modificações que fazem das relações verdadeiras alianças propulsoras de uma vida social em plena expansão. Só pelo excesso nos tornamos aptos a dar e ser generosos. E só nestas condições poderemos formar cidadãos aptos a construir um campo de consistência e composição de tecidos sociais libertários. Homens realmente livres - com força suficiente para resistir e conjurar as ingerências de poderes alienígenas ao campo de imanência de uma sociedade civil - livres de um modelo de acumulação e consumo de energia mortificada e de produção de relações de troca ou de transmissão abstratas, que separam os homens de suas próprias capacidades de agir e de pensar.

Livres por estarem ligados a sua própria potência de produzir e afirmar seus devires criadores. É a partir do modo como se produz e transmite energia, que não mais parasita, mas que estabelece autênticas simbioses, que as condições de existência da vida poderão encontrar seu meio de expansão e expressão da alegria, efeitos do aumento da capacidade de agir e pensar da Terra, na Terra, pela Terra.


Referências Bibliográficas

Deleuze, Gilles - ‘Controle e Devir', in Conversações, Ed. 34, SP
Epicuro - Epicuro e les épicuriens (textes choisis), PUF, Paris
Espinosa, Baruch de - Tratado Teológico Político, Imprensa Nacional, Casa da Moeda, Maia, Portugal
Espinosa, Baruch de - L'Éthique, Gallimard, Paris.
Espinosa, Baruch de - Tratado Político, Os Pensadores, Ed. Abril, SP
Foucault, Michel - Microfísica do Poder, Ed. Graal, RJ
Foucault, Michel - Vigiar e Punir, Vozes, Petrópolis.
Fuganti, Luiz - Saúde, desejo e Pensamento, Hucitec, SP
Hobbes, Thomas - Leviatã, Os Pensadores, Ed. Abril, SP
La Boétie, Etienne de - Discurso da servidão voluntária, Brasiliense, SP
Lucrécio - Lvcrecio De rerum natura, Bosch, Barcelona.
Nietzche, Friedrich - Além do Bem e do Mal, Cia. das Letras, SP
Nietzche, Friedrich - Genealogia da Moral, Ed. Brasiliense, SP
Reich, Wilhelm - Psicologia de Massas do Fascismo, Martins Fontes, SP



O Rouxinol e a Rosa





Adaptação do conto de Oscar Wilde,

por Lady Foppa



Um rouxinol vivia no jardim de uma casa.

Todas as manhãs, uma janela se abria...

...e um jovem comia seu pão,

Enquanto olhava a beleza do jardim.

Sempre caiam farelos de pão no parapeito da janela.

O rouxinol comia os farelos, acreditando

Que o jovem os deixava de propósito para ele.

Assim, criou um grande afeto por aquele que

Se preocupava em alimentá-lo...

...ainda que com migalhas.

Um dia, o jovem se apaixonou.

Mas, ao se declarar, sua amada impôs uma condição

Para retribuir seu amor:

Que na manhã seguinte ele lhe trouxesse

A mais linda rosa vermelha.

O jovem percorreu todas as floriculturas da cidade,

Mas sua busca foi em vão.

Nenhuma rosa... Muito menos vermelha.

Triste, desolado,

Ele foi pedir ajuda ao jardineiro de sua casa.

O jardineiro declarou que ele poderia presenteá-la

Com petúnias, violetas, cravos...

Qualquer flor, menos rosas.

Elas estavam fora de época;

Era impossível conseguí-las naquela estação

O rouxinol, que escutara a conversa,

Ficou penalizado com a desolação do jovem

Teria que fazer algo para ajudar seu amigo

A conseguir a flor.

A ave então procurou o Deus dos Pássaros, que falou:

- Você pode conseguir uma rosa vermelha

Para o seu amigo...

...mas o sacrifício é grande e poderá custar-lhe a vida!

- Não importa, respondeu a ave.

O que devo fazer?

- Bem, você terá que se emaranhar em uma roseira,

E ali cantar a noite toda, sem parar.

- O esforço é muito grande; seu peito pode não agüentar...

- Assim farei, respondeu a ave.

É para a felicidade de um amigo!

Quando escureceu,

O rouxinol emaranhou-se em meio a uma roseira

Que ficava em frente a janela do jovem.

Ali, pôs-se a cantar seu canto mais alegre,

Pois precisava caprichar na formação da flor.

Um grande espinho

começou a entrar no peito do rouxinol,

E quanto mais ele cantava,

Mais o espinho entrava em seu peito.

Mas o rouxinol não parou.

Continuou seu canto, pela felicidade de um amigo.

Um canto que simbolizava gratidão, amizade.

Um canto de doação, até mesmo da própria vida!

Pela manhã, ao abrir a janela,

O jovem se deteve diante da mais linda rosa vermelha,

Formada pelo sangue do rouxinol.

Nem questionou o milagre, apenas colheu a rosa.

Ao olhar o corpo inerte da pobre ave, o jovem disse:

- Que ave estúpida! Tendo tantas árvores para cantar,

Foi se enfiar justamente em meio a roseira

Que tem espinhos.

Pelo menos agora dormirei melhor,

Sem ter que escutar seu canto chato.




Quem já sofreu a dor da ingratidão, gerada pela falta de reconhecimento e pelo descaso, entende a mensagem dramática desse texto. Doar-se até morrer; morrer de tanto amar e doar-se... e ser desprezado.

É muito triste mas, infelizmente,...

Cada um dá o que tem no coração...

E cada um recebe com o coração que tem...


Fábula: morrer de amor, por amor...

Realidade: até onde vai a doação? A entrega?

Mito: eu tenho o poder da sua felicidade nas minhas mãos...

Aprendizagem: amor incondicional!

Medo: de uma tal morte.

Coragem: de uma tal doação...

Pergunta: onde está o amor próprio do rouxinol?

Pergunta 2: A ilusão gera amor?

Pergunta 3: O jovem era egoísta?

Pergunta 4? Será que o jovem é mesmo ingrato?



É possível ver o rouxinol como um abnegado, amoroso e desapegado, que dá seu amor e afeto... incondicionalmente; e, dá para vê-lo, também, como um imbecil iludido, encantado com a possibilidade egoísta de fazer o outro feliz, tornando-se, assim, a vítima do próprio desejo... e se vitimando para salvar o outro.

Alguma outra forma de ver?





23 novembro, 2008

"Diálogo"... por Rita Apoena



"Diálogo:

— E você, por que desvia o olhar?

(Porque eu tenho medo de altura. Tenho medo de cair para dentro de você. Há nos seus olhos castanhos certos desenhos que me lembram montanhas, cordilheiras vistas do alto, em miniatura. Então, eu desvio os meus olhos para amarra-los em qualquer pedra no chão e me salvar do amor. Mas, hoje, não encontraram pedra. Encontraram flor. E eu me agarrei às pétalas o mais que pude, sem sequer perceber que estava plantada num desses abismos, dentro dos seus olhos.)

— Ah. Porque eu sou tímida."

Rita Apoena

......................................

Que lindo isso.... ai ai
Já senti, vi, vivi, senti e testemulhei (em Outros... timidos)!

Socorro... paisagens de montanhas, lagos, mares, desertos (povoados de muitos... ventos e afins...) e até de ambientes antarticos... nos olhos... ai ai... me TOCAM... e enchem de mudo espanto e admiração.

E quando o ar me falta então...... aaaaaaaaauuuuuuuuuuuuuuuuu


............

Abissal

As regiões abissais dos seus olhos
Escondem e traem o calor
Que o gelado ar - do olhar - tenta impor.

Ilusão de retina:
Amor transformado em desejo de não sentir.
A quem você pensa que engana?
A mim, com certeza.

As regiões abissais dos seus olhos
Mostram e traem a dor do amor
Que o mistério - no olhar - quer revelar.

Ilusão de retina:
Desejo de amor transformado em intocabilidade!
Quem você pensa que engana?
A si própria, certamente.
(Cerriky)



http://www.youtube.com/watch?v=ajZxYa2cMyQ


(não é possível assistir aqui... só no You Tube... porque "A incorporação foi desativada mediante solicitação" ... em dezenas de links para esse vídeo e os motivos não são apresentados).

Ela é Linda, Perfeita...
Movimentando-se
Parada
Deitada
Com e sem make up
e... o olhar... então...
sem comentários!




Marillion : Chelsea Monday




Espetacular
Adoro Marillion COM FISH nos vocais desde... sempre!
Letras e sonaridade impecáveis.
Interpretação... idem.








22 novembro, 2008

Acredito nas Pessoas, por Breno Angellis







Acredito nas pessoas.
Especialmente naquelas em que habita
algo mais que a humanidade.
Aquelas que, às vezes, a gente confunde
com anjos e outras entidades divinas...
Falo daquelas pessoas que existem
em nossas vidas, e enchem nosso espaço
com pequenas alegrias e grandes atitudes...
Daquelas que te olham nos olhos
quando precisam ser verdadeiras,
que tecem elogios, agradecem
e pedem desculpas
com a mesma simplicidade de uma criança...
Pessoas que não precisam fazer jogos
para conseguir o que buscam,
porque seus desejos são realizados
por suas ações e reações,
não por seus caprichos...
Pessoas que fazem o bem e se protegem do mal,
apenas com um sorriso, uma palavra,
um beijo, um abraço, uma oração...
Pessoas que atravessam as ruas,
sem medo da luz que existe nelas,
caminham firmes e levantam a cabeça
em momentos de puro desespero...
Pessoas que erram mais do que acertam,
aprendem mais do que ensinam
e vivem mais do que sonham...
Pessoas que cuidam do seu corpo,
porque este os acompanhará até o fim.
Não ficam julgando gordos ou magros,
negros ou brancos...
Pessoas, simplesmente pessoas, que nem sempre
têm certeza de tudo, mas acreditam sempre.
Transparentes, amigas, espontâneas,
até mesmo ingênuas...
Prefiro acreditar em relacionamentos baseados
em confiança, serenidade, humildade
e sinceridade...
Prefiro acreditar naqueles encontros,
que nos transmitem paz e um pouco de gratidão...
Prefiro acreditar em homens e mulheres,
que reverenciam a vida com a mesma intensidade
de um grande amor...
Que passam pela Terra e deixam suas marcas,
suas lembranças, que deixam saudades
e não apenas rastros...
Homens e mulheres que habitam o perfeito universo
e a perfeita ordem nele existente...
Homens e mulheres de alma limpa
e puros de coração.


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Algo se passa nessa poesia.
Um devir está tendo passagem?
Qual?
Um devir espiritual?
Um devir amoroso?
...
Sei lá...
Penso que encontros podem ter uma conotação angelical, dada a emoção e acolhimento que produzem e fazem-se sentir...
Penso que "pureza de coração e alma limpa" são estados de ordem dentro do caus, ou, então, um caus que se organiza num determinado momento.

Neste instantes, mágicos, por assim dizer, a arte do encontro acontece, numa de suas muitas possibilidades...
Estou dizendo, também, que atitudes não angélicas e não puras, podem vir a ser, tornar-se... num tempo presente-esticado... puras e angélicas.

Quem me impediria de sonhar?





Quem me impediria de sonhar?
Senão a minha dor bem mais intensa!
Sou muito resistente,
o meu olhar Resgata
em teu olhar a recompensa.

Quem me impediria de te amar,
Senão teu coração mais arredio,
Que às vezes nem me diz se vai voltar
E sai buscando um mar...no meu navio.

Quem me impediria de querer
Teu corpo, mesmo silenciosamente?
Se fecho os olhos, busco te rever...
No espelho de um amor inconseqüente.

Procuro nos meus sonhos te esconder,
Mas meu olhar te mostra a todo instante...
Quem mais me impediria de te ter,
Se sou, sem nem saber... o teu amante?

(Luiz Gilberto de Barros)




Em Mianmar, solidariedade é condenada e dá cadeia



CORREIO DO POVO PORTO ALEGRE, SÁBADO, 22 DE NOVEMBRO DE 2008


Mianmar prende dupla que ajudou vítimas de furacão


Rangun — O ator mais popular de Mianmar, Zarganar, e o jornalistas esportivo aZaw Thet Htwe foram condenados ontem a 45 e 15 anos de prisão, respectivamente, por terem ajudado às vítimas ciclone Nargis que, em maio, deixou 138 mil mortos ou desaparecidos. Ambos foram presos depois de organizar envios de ajuda às vitimas, denunciou a irmã do ator, Ma Nyein. O regime militar birmanês foi muito criticado por ter bloqueado o envio de ajuda por parte de organizações internacionais aos 2,4 milhões de flagelados do ciclone.