14 outubro, 2010

Dilma e Serra: polêmicas e busca de votos, ou sobre "A questão do aborto" e "O novo eixo do mal"






Já FUI militante do PT. 
Não sou mais.


Essa campanha à Presidência da República no Brasil, anda batendo às portas da Idade Média, quando se colocava na fogueira os livros, os escritores, os cientistas e os antagonistas de todos os tipos, que não concordavam e/ou não se submetiam aos ditames da Igreja.
Também bate às portas do período Guerra Fria, quando expressões com "comer criancinhas" e "matar criancinhas" eram prática comum para designar comunistas e socialistas, tentativas de imputar e criar medo nas pessoas...

Que a Dilma não tem o carisma do Lula, Do Mercadante, do Olívio Dutra, do Tarso Genro, da Maria do Rosário, só para citar alguns, é evidente.
Aliás, é minha opinião que ela não tem carisma nenhum... aqueles olhinhos pequenos, com aquele sorriso quase forçado... . chega a dar uma certa desconfiança... à primeira vista.

Olhando e observando um pouco mais e se detendo, no entanto, às falas, ao conteúdo do discurso, no tom de voz e principalmente às propostas da coligação que oferece Dilma como candidata, pelo PT, essa primeira impressão some, quase que por encanto. 

Isso, me parece ainda muito mais verdadeiro, quando fazemos o mesmo com Serra, que, ao contrário da Dilma, tem uma ótima "aparência" inicial e vai se desmanchando completamente à medida que se observa a voz, o conteúdo - e a ausência dele - do discurso e as propostas de governo com mais atenção. É DEMAGÓGICO. Em excesso.  E tem excesso de demagogia. Ora vai construir trens e metro no país inteiro em quatro anos... o que é isso?
Aquele sorrisinho aberto e aqueles olhos expressivos... querendo passar a idéia do menino bomzinho e comportado... do político popular e amado pelo povo... hummmm... comecei a pegar nojo.
Todo aquele que quer aparentar - desejo de imagem - ser MUITO bonzinho, comportado, querido, sorridente... o tempo todo, modulando a voz para sustentar essa imagem ... é um perigo. 
Desconfio sinceramente dessa criatura.
Não só desconfio. Literalmente, não confio.

Dizer que "Serra é do Bem" é o mesmo que insinuar que Dilma é do mal, aliás, era isso que os mega republicanos Bush, pai e Bush filho, à época presidentes dos EUA... diziam sobre si próprios. O eixo do mal era Sadam Hussein no Iraque e Bin Laden no Afeganistão.Os "terroristas" eram os outros. Sempre os outros é que são incompetentes, inexperientes,... enfim.
Refrescando a  memória, vale lembrar que nas campanhas eleitorais anteriores, em todas as que Lula participou, também diziam que ele não tinha sido eleito para nada e que não poderia ser presidente do Brasil, já que, além da inexperiência parlamentar, ele era ignorante, pobre, nordestino e metalúrgico.

Essa é uma prática discursiva que retarata uma visão de mundo onde existe antagonismo frio e permanente entre bons e maus, entre experientes e inexperientes, entre homens e mulheres, entre , entre, entre.
Ora, isso é fascista.
Podre. Nojento. E discriminatório...

A propaganda do Serra na TV me dá asco. Ojeriza.
Supor que Dilma não foi eleita para nada e que, portanto, não tem condições de ser presidente da República é o mesmo que dizer que um recém formado não pode iniciar um trabalho porque não tem experiência; é o mesmo que dizer que uma pessoas com 30 anos de experiência administrativa não pode iniciar outra atividade "não administrativa"; é o mesmo que dizer que um médico dermatologista não pode ter caspa ou desenvolver uma alergia na pele; é o mesmo que dizer que um psicólogo não pode ter problemas na sua vida.
É a lógica da contralógica. É a lógica da inversão.É uma lógica perversa e sádica.

A questão importante não é essa, mas sim o fato de que a experiência é construída de múltiplas maneiras, através de muitos caminhos, de desvios, de inesperados.
Além do que, ter experiência é condição muitas vezes necessária, mas não suficiente, de que algo se saia bem e conforme o esperado e desejado.
A turminha do PSDB deveria ler e estudar um pouco mais de filosofia para aprender a pensar a política de uma forma mais aberta e menos sectária. Menos dogmática.Há um artigo em que Edgar Morin, por exemplo, que fala sobre As Insuficiências da Experiência e sobre O Desconhecido do Conhecimento... rs

Serra tem bastante experiência em cargos eletivos e  fez o quê com ela?
Colocou polícia de choque em cima de professores que estavam fazendo paralisação e reivindicações legítimas, apoiadas por órgão de classe social e legitimamente constituídos. Também usou gás lacrimogenio e jatos de água para afastar os manifestastes, segundo soube. Isso só para citar um exemplo. Aliás, o mesmo aconteceu aqui no RS no governo na Ieda Cruzius... também desse abjeto PSDB.

Repudio fortemente a propaganda eleitoral do Serra quando fica mostrando mulheres grávidas à meia luz
dizendo que ele é favorável à vida. Só falta ele colocar imagens de crianças mortas e ou achadas em latas de lixo e dizer que é isso que a Dilma quer, quando não... apontar ela como responsável!
Acontece que isso seria óbvio demais. A tática de"dizer-não-dizendo" e de subliminar estímulos que tentam inviabilizar o raciocínio são mais eficientes. Que nojo.

Que ambos os candidatos estão "fazendo o jogo" da mídia para atender as complexidades que envolvem uma eleição presidencial, é inegável.
Jogo por jogo, eu prefiro o da Dilma, que é mais e melhor jogado porque mostra as cartas, define as regras e convida a participar do jogo, diferente do jogo do outro candidato, que faz tudo ao contrário disso. Aliás, acho que é ainda pior do que isso, pois já que ele diz ser do bem e possui A VERDADE, possivelmente ele nem considera estar jogando. Deve ser intriga da oposição. Certamente é.

E é por esse tipo de dissimulação, em parte, que meu voto vai para a Dilma. 100% certo e convencido.
Já fui militante do PT. Já cantei Lula lá. Já andei com bandeiras na mão. Já chorei muito pela confiança e pelas mudanças que acreditava, seriam feitas no Brasil sob seu governo.
O Brasil melhorou muito sob a governo Lula e com a moeda, o Real, criada no governo FHC, que Lula continuou e incrementou. Nunca na história brasileira o Brasil foi tão bem visto e respeitado no exterior.
Também já me desacreditei, frustrei e sofri com alguns dos escândalos sob o governo PT.
Mas a confiança voltou e a vontade de acreditar em mais e melhor para nós também
Dilma consegue me emocionar e fez despertar, novamente, a esperança, que muitos tentaram, e continuam tentando, desmoronar.
Nunca fui filiado ao PT e nem a partido nenhum, importante dizer: gosto da liberdade que essa ausência institucional permite.
Mas, além disso, também tenho memória. Tivemos 16 anos seguidos de governo PT  em Porto Alegre e, verdade seja dita, NUNCA a cidade esteve tão bem em todos os sentidos, desde a limpeza urbana até as manifestações culturais e artísticas que foram estimuladas e criandas como nunca antes havia sido feito.
O mesmo pode ser dito acerca do Governo Olívio Dutra no estado.
É por essas e outras que voto em Dilma.
Serra jamais. Me é impossível.

Os textos abaixo, de Juremir Machado da Silva, colunista do Correio do Povo, falam por si só.

PORTO ALEGRE, TERÇA-FEIRA, 12 DE OUTUBRO DE 2010
A questão do aborto    

O aborto é legal em alguns dos mais católicos países do mundo: na Itália papista, na Espanha da Opus Dei, em Portugal e na França. É permitido também nas nações mais desenvolvidas e civilizadas do planeta: Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, Dinamarca, Áustria, Suécia, Suíça, Noruega, Irlanda, Escócia, etc. Em geral, até o terceiro mês de gestação. Em todos esses lugares, obviamente, há quem seja contra. Em estados laicos, porém, resta às religiões aconselharem seus adeptos a agirem desta ou daquela forma. Estará o Brasil na vanguarda? Ou apenas em contradição? Dilma Roussef, para não perder votos, está sendo obrigada a renegar as suas convicções. É do jogo.

A legislação brasileira permite o aborto em dois casos. Por exemplo, se houver estupro. José Serra normatizou a aplicação dessa lei em São Paulo. Em termos rigorosamente lógicos, cabe perguntar: a defesa de uma vida permite exceções? Não seria o caso, como querem os mais extremados, de dizer que vida é vida independentemente das condições da sua geração? Parece justo afirmar que Serra é favorável só ao assassinato justificado de crianças. É isso mesmo? Ou, seguindo a tendência da Europa e dos Estados Unidos, seria mais razoável justamente o oposto, ou seja, permitir o aborto em nome da liberdade da mulher até certo momento da gestação definido pelas condições atuais da ciência? Uma coisa é certa: uma candidata ser obrigada a negar o que pensa, em consonância com os países mais adiantados do mundo, para obter votos conservadores é uma contradição.

Mais estranho ainda é que o candidato de um partido que se quer moderno, racional e sofisticado entre nessa jogada. Serra poderia ser acusado de infidelidade partidária: está trocando o PSDB pelo Dem em plena campanha. Enquanto isso, mulheres ricas fazem abortos em boas clínicas clandestinas. Jovens pobres fazem do jeito que dá. Será que há uma real preocupação com a defesa da vida nesse entrevero ou se trata apenas de uma maneira duvidosa de pegar a adversária no contrapé? O problema é mesmo o aborto ou é a manutenção de programas como o Bolsa-Família? A questão do aborto precisa entrar na pauta da sociedade brasileira um dia depois das eleições. Por que não se faz o plebiscito proposto por Marina Silva? As posições religiosas devem ser respeitadas e entrar no debate. Mas é a sociedade que deve decidir.

O jeito como a questão do aborto entrou nesta campanha eleitoral só pode ser rotulado de uma forma: baixaria. Prova de que na hora do pega para capar, como dizemos, qualquer método é válido. Já vimos esse filme. É a política do terrorismo simbólico. A opção de Dilma Rousseff parece pragmática: dar um passo atrás, constrangida, para quem sabe dar dois passos à frente. A de Serra parece o oposto: dar um passo à frente para talvez dar dois passos atrás. Uma sociedade aberta precisa decidir sobre temas que antes eram tabus: aborto, casamento de homossexuais, liberação das drogas. Quanto a este último item, Serra está atrasado em relação a Fernando Henrique? Será por isso que fica longe dele?


PORTO ALEGRE, QUARTA-FEIRA, 13 DE OUTUBRO DE 2010
O novo eixo do mal 

A mídia de São Paulo é uma piada semipronta. É só dar um calor para passar do ponto. O Estado de S. Paulo brada aos quatro ventos que está sob censura judicial em favor de um filho do imperador do Maranhão, o marimbondo meio moribundo José Sarney. O Estadão tem razão em protestar. Mas, na semana passada, demitiu a psicanalista Maria Rita Kehl por um grave delito de opinião: ela publicou um artigo defendendo o Bolsa-Família. Viva a liberdade de expressão! Alguns dias antes, o mesmo Estadão, que volta e meia defende o jornalismo isento, abrira seu voto para José Serra. Achincalhado na Internet, o Estadão deu uma de Estadinho: enrolou. Kehl não teria sido demitida. Só convidada a não falar de um assunto bem pouco oportuno neste momento: política. Uau!

A conversa fiada evoluiu para algo assim: a rotatividade de colunistas é grande. Por fim, a casa caiu. Maria Rita Kehl confirmou sua demissão. O Estadão que demitiu Maria Rita é o mesmo que vive tentando assustar as velhinhas com uma suposta ameaça de ditadura, com censura à imprensa, pela esquerda brasileira, especialmente se Dilma, rotulada de "mal a evitar", for eleita. O que significa isso? Que o Estadão é um jornal  reacionário, autoritário e desesperado. Teve medo que Maria Rita Kehl elegesse Dilma Rousseff com a sua imensa capacidade de formar a opinião dos leitores. O mais engraçado é ver e ouvir os serristas tentando justificar a atitude do provinciano jornalão paulista. A tese deles é muito sofisticada: ela teria passado dos limites. Uau!

A Folha de S. Paulo não quer ficar atrás. Convenceu a Justiça a bloquear um blog chamado "Falha" de S. Paulo. Torrou uma velha piada. Censurou o humor. Até parece a legislação eleitoral brasileira. Veja, Falha e Estadinho querem ter o monopólio do insulto, da ironia e da censura. Será que o Brasil jamais terá jornais nacionais? Veja, Falha e Estadinho formam o novo eixo do bem. O bem deles tem cara de mal para a maioria. São mais xiitas, fundamentalistas e radicais do que o Irã, a Al-Qaeda e o Bin Laden. Estão em cruzada contra o comunismo que não existe mais e contra o Bolsa-Família, programa que cria nos mais pobres um vício terrível: comer. O Estadão botou luto na sua capa quando morreu um dos mais nojentos ditadores da América Latina, o asqueroso Augusto Pinochet. A Falha de S. Paulo, ao final da ditadura brasileira, precisou mudar de cara para apagar o seu comprometimento com o regime.

O jornalismo vive de mitologias divertidas. Roberto Marinho, pilar da ditadura, que o ajudou a edificar a Rede Globo passando por cima das leis, foi biografado por Pedro Bial como um verdadeiro e hábil resistente ao arbítrio verde-oliva. O Estadão adora posar de censurado pelos brutamontes de 1964, instalados nas redações armados de tesoura, publicando Camões e receitas de bolo no lugar dos textos ceifados. Valeria uma receita de bolo de fubá no lugar da Maria Rita. A liberdade de expressão é total na Veja, na Falha e no Estado: basta estar com Serra em defesa do bem universal contra o mal vermelho.

Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br

07 outubro, 2010

Esquerda e direita e Cervejão Tiririca, por Juremir Machado da Silva



Esquerda e direita

A direita brasileira adora afirmar que não há mais direita e esquerda. Imediatamente passa a criticar a esquerda. Conclui-se que no Brasil só haveria esquerda. A direita se vê como não ideológica, a pura expressão da verdade. Nos Estados Unidos seria o contrário: há direita, mas quem é mesmo a esquerda? Na Alemanha, todo mundo quer ser de centro. Na França, direita e esquerda designam-se como tal. Um parlamentar, na televisão, diz: "Nós da direita...". Em Israel, direita e esquerda representam projetos cristalinos. A campanha eleitoral brasileira revelou que o Brasil tem direita e esquerda bem definidas: PSDB e PT. Tem também extrema-direita e extrema-esquerda: Dem, PP, PSol, PSTU, PCO. Também não falta centro (direita ou esquerda): PTB, PMDB, PV, PDT.

Apenas dois partidos têm projetos nacionais: PT e PSDB. O PMDB oscila entre eles de acordo com as conveniências, com ligeira inclinação à esquerda e grande inclinação para os cargos. Os tucanos, ao firmarem pacto com o Dem, resvalaram para o discurso reacionário típico da UDN dos anos 1950. O último governo de Getúlio Vargas, que acabou no suicídio do presidente, foi de centro-esquerda. Não havia Bolsa-Família. Mas Getúlio assinou um aumento de 100% para o salário mínimo e criou a Petrobras, frustrando os interesses de multinacionais e de seus parceiros nacionais. Restou para a direita o discurso "moralista" contra a corrupção. A Tribuna de Imprensa, de Carlos Lacerda, era a Veja da época. O Estado de S. Paulo era o Estadão conservador de sempre.

A corrupção sempre deve ser denunciada. Impiedosamente. Pode-se, no entanto, perguntar: quando termina a denúncia e começa a campanha política disfarçada de jornalismo investigativo? O truque consiste em transformar o que é pontual em total. Converte-se um sinal na pele em sintoma de uma metástase. Já ouviram falar em metonímia? É uma figura de linguagem pela qual, segundo o Aurélio, entre outras coisas, a parte pode representar o todo. Direita e esquerda usam esse mesmo recurso: se a parte sabe, o todo sabe. Se a parte está contaminada, o todo também. Em geral, é pura inferência. Como dizia Balzac, para a imprensa tudo o que é provável (verossímil) é verdadeiro. Os fatos nem sempre concordam.

A direita brasileira recusa-se a assumir-se como direita. De quebra, tenta convencer a esquerda a negar-se. O PSDB bem que podia dar um bom exemplo e admitir que se tornou de direita. É legítimo. Essa conversa de que esquerda e direita são termos e expressões ultrapassadas está ultrapassada. Foi um golpezinho retórico dos anos hegemônicos do neoliberalismo. Caducou. Fez parte de uma guerra ideológica e de marketing. Todo tucano adora pensar que é racional e que só o seu adversário tem ideologia. Os tucanos acham que as ideias dos outros são opiniões, enquanto as suas seriam constatações. Há petistas, por seu turno, que gostam de imaginar que têm projetos, enquanto os outros só teriam interesses. A eleição foi categórica: esquerda e direita em confronto.

PORTO ALEGRE, QUINTA-FEIRA, 7 DE OUTUBRO DE 2010


Abaixo fragmento do texto publicado por Juremir hoje, dia 8/10/2010, no mesmo jornal:

Cervejão Tiririca

Uma campanha eleitoral nem sempre tem muitos pontos altos. Baixos não faltam. Tiririca foi o que de pior essa eleição produziu. Elegeu-se arrastando uma penca de parasitas. Depois de muito refletir e pesquisar, descobri quem votou no palhaço: os bebedores de cerveja retratados nas propagandas da televisão. É o maior e mais barrigudo colégio eleitoral brasileiro. São aqueles caras que adoram uma "sacanagem" e admiram publicidades grotescas em que um cara aparece rebolando só de cueca ou passando trote no amigão. Não foi voto de protesto, mas voto do cervejão, ão, ão, ão. Só para "empulhar" o sistema. Uão!

Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br

04 outubro, 2010

"Sou Transparente...", por Santaroza





Sou transparente,
Tanto quanto me permite a vida.
Mas a transparência não esta em mim,
E sim nos olhos que me desnudam.
Sou pedra bruta,
Teu olhar é que me lapida.
Por isso transparência depende,
De que lado você se encontra do sol.

(Santaroza)

Jon and Vangelis: State of Independence ou, sobre estar protegido das dependências inoperantes








Sim, estamos protegidos.


A magia que vem do bom humor,
da alegria,
do ócio produtivo (kkkkk),
da fé e da esperança renovadas...
sempre é uma boa proteção.


Antídotos contra mal-estares improdutivos... 
e despotencializantes.




Jon and Vangelis: 
State of Independence 








02 outubro, 2010

Ser seletivo, eis a opção, ou sobre bons encontros, amor e decisão



Ser seletivo, eis a opção!
Trata-se de escolher (bons) encontros e não de desprezar pessoas.
Trata-se de escolher entre... poder e potência !

Simples assim.
Nem tão simples...
assim!

Há que se abrir muito bem os olhos, o coração, a intuição, as sensações
e... ainda por cima, pensar.

É um "estar atento" ao que se passa efetivamente, 
apreendendo a distinguir as relações que se estabelecem 
entre realidade, virtualidade e atualidade, 
bem como entre (o que é) social, pessoal, íntimo, público e privado.

Eu escolho bons encontros: potencializantes de desejo de vida.
Usar o poder de afetar e ser afetado nessa busca.


O pensamento deleuzeano
tende a promover uma
proliferação intensiva de bons
encontros ao mesmo tempo
em que assume o ponto
de vista de saídas para
a vida, mesmo porque,
segundo ele, “não há
obra que não indique
uma saída para a vida,
que não trace um
caminho entre as pedras”.




Trata-se de ver
como Deleuze,
em seus encontros
com Nietzsche
Bergson e Espinosa,
pensa a favor de uma
singular ética vitalista.

Como ele distingue
vontade de poder
e vontade de potência,
como isto atua
como critério
de seleção dos encontros.


Com Espinosa, ele pensa
distinguir bons
e maus encontros
em função
de duas dimensões:
a da composição
das relações constitutivas
dos seres e
a da variação do poder
de afetar
e de ser afetado.

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Bons Encontros:

- Um arrepio na espinha: potência
desejante de crescer e vencer...
que vem como uma afirmação
do próprio desejo de não repetir...

- Uma forma de saber quem sou
e como estou. Com arte e beleza.

- Uma doce suavidade inesperada
e cheia de pimenta com chocolate,
ou... seriam... cerejas?

- Uma agressiva investida de
opiniões contrárias.
Sempre contextualizadas.

- Uma estranha maneira de
nos despersonalizar
fazendo emergir "um outro"
de nós, desconhecido
de ambos.

- Uma força e uma sensibilidade
insuspeitas e insuspeitadas.

- Um desejo de mais e melhor vida.

- Afetar e ser afetado por poderosas
correntes de viver a vida conforme os
próprios valores, crenças e experiências.
Uma abertura ... para ver e conhecer.

* Cesar R K *

Esta posição de ser seletivo na busca de "bons 
encontros"está fundamentada numa atitude ativa de

sensações potencializantes e nada tem a ver com o 
julgamento precipitado de pessosas e comportamentos;

nada tem a ver com a estética e a forma "da primeira 
impressão"; nada tem a ver com estereótipos e 

preconceitos de qualquer tipo e, finalmente, nada tem a 

ver com a romantização de um amor universal que não 

sabe dizer não e preconiza que todas as pessoas tem 

algo de bom para dar e oferecer.


Tem a ver, isso sim, com o conjunto contextualizado de 
tudo isso que foi citado e, mais ainda, com a sensação 

de bem ou mal estar que esse encontro, ainda em estado 

de virtualidade, provoca.


Virtualidade (real) como um espaço-tempo embrionário 
que ainda não está processado, ainda não está 

"materializado" como uma atualidade do encontro.


Mas, mais uma vez, a dificuldade está em se entender 
que as sensações podem apontar caminhos bifurcados e 

híbridos, portanto não lineares e não baseados na ação e reação, já que, exatamente, uma primeira impressão, só para citar um exemplo, pode ser negativa, agressiva, e até desestimulante, porque estava baseada em 

pressupostos e expectativas irreais e fantasiosas.

Noutras palavras, um bom encontro pode se dar 
exatamente
 por esses motivos, ou seja, houve um 
desafio para que eu me des-reconheça no que sou/estou e 
passe a possibilitar-me um outramento - descobrir um 
outro de mim, ou outros - se me arriscar nesse contato 
com esse outro ou essa coisa... que, a princípio me 
incomodou, me afetou de forma "negativa".



Mais frequentemente, no entanto, acontece de lermos 

algo, vermos alguém, ouvirmos algo que imediatamente 

nos afeta de uma tal maneira que nos sentimos 

compelidos, estimulados, desejosos de participar, nos 

entregar, sentir, pensar, ouvir, perceber, intuir, 

fazer algo diferente do que estamos acostumados.

Uma espécie de estranhamento se apodera de nós e nos 
move, como que através de um contágio - afetivo, 

intelectual, relacional, ideológico, artistico, 

espiritual, social E/OU qualquer outro - a buscar a 

diferença de nós próprios, de nossa maneira usual de 

ver, viver, perceber e agir na vida.


Acontece de A Vida nos atravessar de uma tal maneira 
que parece que, antes disso, desse momento, nunca, de 

fato, a havíamos vivido, conhecido, esperimentado.

É o poder de ser afetado.


Desejamos mudar algo em nós ou no entorno ou na 
essência
 mesma daquilo que nos afetou no 


e pelo 
encontro. 
Desejo de vida.
Uma abertura. 
Uma sensação muito forte e quase irressitível de 
potência. 
Uma nova força. 
Uma nova impregnação e um mergulho para além de nós 

mesmos que nos arrebata e nos faz sermos nós mesmos, 

de 
novo, de um outro jeito... já não tão identitário, 
egóico, cheio de melindres, desculpas e culpas.
Uma nova... delícia para saborearmos.


Também acontece frequentemente de lermos algo, vermos 
alguém, ouvirmos algo que imediatamente nos afeta de 

uma tal maneira que nos sentimos compelidos, 

estimulados, desejosos de sair correndo, fugir, sumir, 

evitar àquela situação ou pessoa, pois que ela nos dá 

uma forte sensação de impotência, de não conseguir 

fazer nada, de ficar inoperante (nada tem a ver com 

silêncio) ou, dito de forma mais apropriada, nos faz 

sentir
 despotencializados, im-potencilizados.

Desejo de morte.
Ficamos com a sensação de que vamos nos incomodar, 
repetir situações desagradáveis, trágicas, estúpidas, 

incapacitantes que já não queremos mais e nem podemos 

ter mais, sob pena de comprometer nossa tão buscada, 

necessária, trabalhada e acolhida necessidade de saúde 

mental, afetiva, relacional, enfim... de vida e 

potência.


Um bom enconto, para ser digno desse nome, envolve, no 
mínimo, duas pessoas, falando-se de encontros 

humanos, ou seja, precisa ser bom para OS DOIS.

Se for só para um... é outra coisa.... amor 
interesseiro, infantil, vampirismo, enfim... essas 

coisas chatas e nojentas... que podemos optar, na 

medida do quanto e do como estamos com os olhos, o coração, e a intuição bem abertos; com as sensações afinadas e livres de estereótipos e preconceitos e... ainda por cima, na medida que estamos pensando com lucidêz. 

Difícil?
Um pouco, mas possível.
É, na verdade, trabalhoso.
Mais fácil é "sair loqueando e loqueteando" 
inconsequentemente feito um hipotético pássaro ou 

borboleta que goza só da liberdade de voar, sem que 

nunca necessitasse parar e pousar.


Nos encontros inumanos, aqueles que se dão com 
"coisas"... podemos estabelecer bons encontros 

altamente potencializantes sem a necessidade do outro.

É o que acontece numa viagem, numa caminhada, numa corrida; com a visão solitária de 
um entardecer ou amanhecer; com as gotas da chuva, 

com 
as folhas no chão, com a observação-contemplação de 
alguém que tem um jeito todo próprio e lindo 
de 
caminhar... sorrir, falar, enfim...
Ainda nesse caso particular "do jeito do outro" que não 
se sabe e não se reconhece observado-contemplado... 
pode resultar de num encontro humano acontecer. 
Se será um bom encontro ou não... 


Essa divagação que estou fazendo, tem a ver com o amor 
decisão, em contrapartida ao amor paixão, no qual somos 

puro arrebatamento, joguete do outro e das nossas 

fantasias ilusórias e românticas.


Estou dizendo que a paixão não promove e não provoca 
bons encontros? Não nos contagia?

Não!
Estou dizendo que a paixão não correspondida e, que, 
mesmo a correspondida, podem cair em territórios de 

loucura, ilusão, doença e despotencialização, a ponto 

de se transformar num vício e numa prisão.

Desejo de morte.

Por fim, quero dizer que o caminho entre as pedras pode passar pelo não peremtório; pelo sim condicional; pelo não ocassional;  pela decisão revisitada e não definitiva (mudança de opinião, de sentimento, de pensamento, enfim...); e, aindam pela experimentação.
Podemos experimentar o caminho, as pedras, os desvios, as brexas, as sensações e... decidir mediante os dados dessa experimentação.
Digo experimentação, não digo só e apenas acerca da "experiência tida", mas da experimentação mesma... tomada por si própria.

Ainda, só para fazer uma distinção, está claro que, 
mesmo o mais "infame" dos monstros desalmados" ou 

"psicopatas-manipuladores de plantão" é capaz de 

promover bons encontros com algum fio, humano ou não, e 

produzir potência desejante de vida.

A questão é, se vamos, ou não, naquele momento, compor 
algum tecido com aquele fio que ele (se) nos apresenta.

Aí... vem a decisão, geralmente difícil e ... 
culpabilizadora quando a resposta é... não.


Tem ainda a questão que quero desenvolver num outro 
post (mais adiante aqui no blog) e que está circulando 

DEMAIS na internet em PPS e no orkut em forma de scrap.

Um assunto "deveras" interligado com esse dos bons 
encontros e sua relação com o outro, o amor e a 

decisão: a noção altamente difundida, repetida acriticamente e repassada "ad infinitum" de que somos os únicos responsáveis (pelas mudanças) na nossa vida e 

que existe alguém que está eternamente nos esperando para nos fazer felizes d e f i n i t i v a m e n t e, ou, sobre... "a volta da alma gêmea, parte 1595624".


Mas isso é para mais tarde.