11 dezembro, 2010

DESLUMBRA O DIA, por Pablo Neruda




Foto de Henri Bonell

DESLUMBRA O DIA

Nada para os olhos do inverno,
nem uma lágrima mais,
hora por hora se arma verde
a estação essencial, folha por folha,
até que com seu nome nos chamaram
para participar de alegria.

Que bom é o eterno para todos,
o ar limpo, a promessa flor:
a lua cheia deixa
sua carta na folhagem,
homem e mulher voltam do mar
com um cesto molhado
de prata em movimento.

Como amor ou medalha
eu recebo,
recebo
do Sul, do Norte, do violino,
do cão,
do limão, da greda,
do ar recém-posto em liberdade,
recebo máquinas de aroma escuro,
mercadorias cor de tormenta,
todo o necessário:
flores de laranjeira, cordéis,
uvas como topázios,olor de onda:
eu acumulo
sem trégua,
sem trabalho,
respiro,
seco ao vento meu traje,
meu coração nu,
e cai,
cai o céu:
numa taça 
bebo
a alegria.

Pablo Neruda
In Memorial de Ilha Negra


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