24 fevereiro, 2009

Conhecendo a Índia: olhares dialógicos, mas amorosos!





Muito, mas muito longe da versão apresentada pela novelinha global "Caminho das Índias" - que, ainda assim, eu assisto sempre que posso - está a Índia verdadeira, com seus múltiplos encantos e com sua falta absoluta de encanto.

Certamente não se chega a esse país de dimensões continentais e com muitos mil anos de história desavisado, como foi o caso da alienada noiva do Raj na novela citada (ela entra e sai da Índia inafetada, parece nada sentir; nem sabia, depois de dois anos de relacionamento com seu namorado indiano, aspectos básicos das características do país dele e da sua cultura, só para citar um exemplo. Claro, nenhuma ilusão de que a novela iria abordar a forte afetação que este país causa a qualquer estrangeiro que lá ponha os pés!).

Digo desavisado porque quem vai para lá já está com algumas informações, geralmente romantizadas e mistificadas, primeiro passo para a mitificação: o mito da Índia exuberante, cheia de templos, luzes e cheiros de incenso, isso por um lado; e, por outro, a pobreza, sempre alardeada, e a miséria da magreza exposta nas imagens das sagradas vacas e dos sadhus errantes.

A índia é tudo isso e muito mais. Uma mistura absolutamente inverossímel de contrários que desafiam a lógica e nos dão a sensação de habitar UM ESPAÇO que se caracteriza pela ausência de tempo. Também há a sensação - incrível isso - de não haver espaço e tudo estar na decorrência do tempo, que aparece como sendo infinito.

Neste estupendo país de contrastes, a beleza e a feiúra andam de mãos dadas; riqueza e miséria estão abraçadas; espiritualidade e materialismo caminham juntos; aromas se misturam com fedores... e assim, infinitamente paradoxal, a Índia desafia conceitos engessantes e definições simplistas, preconcebidas e reducionistas.

Jomar Moraes nos diz assim:

Como suas deidades, que mudam de rosto e humor, a Índia encanta e surpreende com seu mundo de contrastes

É difícil amar a Índia", escreveu Jean-Claude Carrière, um dos grandes roteiristas do cinema contemporâneo, autor de um livro em que expõe sua paixão por esse país distante e enigmático. Quarenta dias depois de percorrer mais de 10 mil quilômetros do território indiano, visitar cidades e vilas, conhecer uma parte de seus templos milenares e de sua modernidade caótica, pousar em ashrams de diferentes gurus e interagir com o seu povo em situações que, não raro, desafiam a lógica, peço licença para acrescentar outro detalhe à constatação do cineasta francês. É também difícil, muito difícil, não se deixar seduzir pela Índia. E mais difícil ainda esquecê-la. Amando-a ou detestandoa - e as duas reações podem ocorrer simultaneamente -, voltamos de lá com um selo indelével aplicado à mente e ao coração, uma marca formatada por choques e êxtases que, de algum modo, nos faz refletir sobre o que jamais pensamos antes.

Mais que misteriosa e mística, a Índia é diversificada e contraditória. E essa predisposição para lidar com os opostos e acolher tudo, tudo transmutando em seu caldeirão de regras escritas e ocultas, é a primeira causa de espanto para quem chega trazendo na bagagem uma visão idealizada do país. Não é confortável ver o clichê de um lugar tranqüilo, asséptico e espiritual, onde as pessoas entoariam mantras o dia inteiro, dissolver-se na poeira, na fumaça e na sujeira das ruas, na algaravia constante das multidões - onipresente num país com mais de 1 bilhão de habitantes -, na miséria exposta de milhões de pessoas, na esperteza de certos mistificadores e, sobretudo, no trânsito infernal das cidades, onde pedestres, carros, riquixás (triciclos movidos a motor ou pedal) e vacas têm de improvisar acordos na ausência de semáforos. Para alguns, é a frustração de um projeto de vida. "Já vi pessoas que vieram para ficar três meses retornarem na primeira semana", disse-me o canadense Gilles Bacon, um professor de ioga de Montreal que, pela terceira vez, está passando um ano na Índia. "Algumas choram, decepcionadas."

Como os conquistadores arrogantes de outrora e os preconceituosos de todas as épocas, os que se agarram aos contornos imaginários de uma Índia etérea e pura acabam impossibilitados de perceber uma outra sutileza desse complexo subcontinente. Na Índia, o presente não descarta o passado e muitas eras compartilham o mesmo espaço, numa aquarela de hábitos, idéias, crenças, filosofias e também ciências, que se relacionam até quando se encontram em aparente rota de colisão.

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Lotus Temple Fé Bahá'í

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Já Jean-Claude Carrière, no seu lindo, desmistificante e fiel livro Índia - Um Olhar Amoroso, nos dias:

"É difícil amar a Índia. A Índia não é um país charmoso, a começar pela paisagem, logo esquecida por causa da presença humana que tanto se impõe em todos os lugares. Quem não gosta dos homens não deve ir à Índia. A multidão é aqui a principal paisagem. Ela é o ator de todos as coisas. Sem dúvida, é por isso que, na literatura indiana de todos os tempos, os personagens são frequentemente atraídos para o exílio e a solidão, a renúncia, a partida. Que o viajante estrangeiro não se engage nessa via de isolamento seria meu primeiro conselho. Que aceite a multidão, que se misture com ela, que nela se perca. Primeira condição do amor: o contato."

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Nesse desapaixonado-apaixonante olhar, o autor caminha, cruza e trilha diferentes territórios existenciais, geográficos, afetivos, religiosos, sociais, históricos... humanos e divinos: um livro básico para quem quer conhecer UM POUCO da Índia verdadeira... sem ir lá.


Eu misturado, num momento em que abriu espaço... kkkk


Foto tirada da porta do hotel, em Delhi.


2 comentários:

Cerikky.. Cesar Ricardo Koefender disse...

Flor postou esse comentário no meu orkut, pois não estava conseguindo fazê-lo aqui. Então, transcrevo.

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Obrigado querida, volte sempre.
Grande beijo e abraço.
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Oi, Cerikky.

Adorável o post sobre a Índia no teu blog.
Como não estou conseguindo postar um comentário por lá,
trago aqui minhas impressõs: a Índia é realmente um país
que nos fascina, e criamos alguns mitos em nossa imaginação.
Tão contraditória e tão cheia de contrastes, por isso mesmo
nos inspira vontade de conhecê-la.
E o teu post nos faz viajar por entre as ruas e o povo indiano.

Amei o comentário por parte do Jean-Claude Carriere:
"aceite a multidão, se misture com ela, nela se perca.
Primeira condição do amor: o contato."

Beijos, e uma excelente semana prá ti!

Anima disse...

Olá, esse blog é magico, inspirador. Qual a sua filosofia de vida, seus gurus?

abraços,
Vanessa