05 fevereiro, 2009

Caminho das Índias II: comentários finais e conclusivos



Assisto essa novela-folhetim sempre que posso... para relembrar as cidades onde estive, para ver as roupas com as quais me identifico e uso há anos, para me encantar de novo e de novo com a Índia e suas belezas.
Mas, a novela em si... é um espanto completo, patética, sem trama e com argumento inconsistente. Muito fraca.
Os personagens são apresentados de maneira estereotipada, beirando o caricatural.
Me sinto revoltado e agredido.

As tramas que acontecem em solo brasileiro, então, são as piores. Todos os personagens são completamente doidos e as relações altamente comprometidas em termos de saúde mental... sem limites, sem auto-crítica; são humano-demasiadamente desumanos: horrível.

Um pai advogado que trata o filho desajustado como um companheiro de adolescência; uma perua que só pensa em beleza e no seu corpinho; uma psicóloga bem inconsequente que não sabe nem se colocar como profissional no local de trabalho e fica aos berros com sua filha ao celular na frente dos internos da clínica; dois irmãos empresários que se odeiam e se degladiam literalmente aos socos e pontapés; uma alienada que namora um indiano há dois anos e não tem nenhuma noção do país de origem, da cultura e dos valores desse local; um empresário galinha que faz e acontece com as mulheres e é apresentado como um homem moderno atual e contemporâneo, mas que censura sem piedade a própria irmã e quer que ela seja invisível; uma adolescente com jeito de intelectual que não usa sua inteligência para fazer frente a esse irmão castrador; e, só para citar mais um personagem nessa trilha de horrores... a exotérica de plantão: aquela criatura que vê o sagrado em tudo, reverencia vacas e macacos como nem os bramanístas mais fanáticos fariam e que se encanta com a vida, mas um encantamento completamente histriônico, histérico e doente.
Dessa trupe do Brasil na novela, talvez o único que seja um pouco saudável é o psiquiatra que não entra na clínica sem que possa pular por sobre o tapete do chão na entrada para clínica... tentativa inventiva de acionar algo nos pacientes que produza afetos e... ações outras que não as convencionais...

Os personagem indianos, igualmente estereotipados, são menos ruins... Juliana está linda e com seus olhos e sorriso se parece fisicamente com os nativos do norte do subcontinente. Márcio Garcia, um dalit adotado por um Brâmane, usa roupas comuns entre os muçulmanos, mas está com uma delicadeza e uma suavidade muito frequente entre os homens na Índia, que caminham vagarosamente e costumam olhar dentro dos olhos dos seus interlocutores com interesse e atenção, principalmente com os estrangeiros e com os seus amigos, conhecidos e familiares.

Os maneirismos do cotidiano, principalmente aquele gesto de virar vagarosamente a cabeça para os lados, numa elíptica que parece dizer não, mas que lá quer dizer sim, foi muito bem apreendida pelos diretores de cena... mas é muito estranho ver brasileiros fazendo isso.
A sempre repetida cena de tocar os pés do guru, dos pais e das pessoas mais velhas como sinal de respeito e devoção também está estereotipada...

O pandit está muito bem caracterizado e o ator está à vontade no papel.

Lima Durte, o Shankar, está excelente... o protótipo do sábio meditativo que ainda se defronta com suas fraquezas e desejos mundanos... 10!

É igualmente estranho ver as cenas nos palácios, no Taj Mahal e demais locais onde acontecem os encontros de Juliana e Márcio... vazios. Claro que fecharam os monumentos e locais turísticos para fazer as tomadas, já que esses mesmos locais estão, como em todos os outros desse que é o segundo pais mais populoso do mundo, cheios de massa humana por todos os lados... incessantemente a maré humana vem como uma onda a se movimentar lentamente...

Toda subjetividade que se produz e reproduz na novela retrata a vida da elite de ambos os países, tanto cá como lá, a novela fala da vida, hábitos, costumes e cotidiano dos ricos.

A linguagem e o uso e abuso de espressões locais aliado à quase nula informação que a maioria das pessoas no Brasil tem sobre a Índia parecem estar funcionando como dificultadores...
O que tenho escutado das pessoas que estão assistindo essa novela global mostra que o tiro saiu pela culatra: a maioria demonstra não estar entendendo aspectos culturais que tentam mostrar na trama e, pior, estão formando noções altamente estereotipados acerca do país e da cultura indianos... noções essa se transformam em preconceitos com a agilidade do vento.

Sem a pretensão de esgotar o assunto aqui, digo que o nome desse post está colocado como final e conclusivo porque já vi o bastante e já percebo que esse estado das coisas não vai de modificar.

A novela é ruim, embora bonita esteticamente.
Resta abstrair... e não se revoltar... tanto... pois querer conhecer algo sobre a Índia nessa novela é correr o risco de aprender muita coisa errada.

Esperar que a pobreza que há na Índia, a chamada "Índia de verdade", apareça na novela... é tão ilusório como esperar que uma vaca começe a cantar.
Por falar em vaca... a cena, também repetida, da vaquinha branca e limpinha entrando na loja para buscar sua alimentação diária... e´surrealista. Isso simplesmente é ... surrealista!

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