18 novembro, 2008

O prazo de validade das soluções




Na química, os elementos são reunidos para produzirem soluções.

A solução é definida como mistura homogênea de duas ou mais substâncias. “ Elas podem ser classificadas quanto ao estado físico, sólidas, líquidas ou gasosas; quanto à condutividade elétrica, eletrolíticas ou iônicas, não-eletrolíticas ou moleculares; quanto à proporção soluto/solvente, diluída, concentrada, não-saturada, saturada e supersaturada.

Assim é, fazendo uma analogia conceitual, na nossa vida.

Se tomarmos emoções e sentimentos como substâncias, podemos imaginar uma solução feita de uma mistura homogênea de expectativa e frustração; de desapontamento e tristeza; de raiva e frustração; de falta de confiança nas pessoas e desejo de não mais se entregar às relações humanas, interpessoais, afetivas; de alegria da espera de que algo aconteça e frustração por não ter acontecido; de apego à racionalidade (ou pior, à racionalização) e desprezo pelos sentimentos; de apego aos sentimentos e desprezo pela racionalidade; de medo e de conduta esquiva (fuga dos conflitos); de sentimento de rejeição e desejo de que o outro tome uma iniciativa; de apego à própria conduta e desejo de que o outro mude... e assim por diante.

Sempre é importante lembrar que estamos, até aqui, falando em misturas homogêneas.

Imaginemos uma solução líquida como sendo aquela cujos elementos afetivos são pouco paupáveis, variam muito conforme o momento, como por exemplo, de falta de confiança nas pessoas e desejo de não mais se entregar à relações e aos afetos: ora queremos retomar e iniciativa e acreditar nas pessoas; ora queremos que o outro peça perdão ou se redima do que fez , ora queremos acreditar, ora não; ora achamos que tudo vai mudar e ora não.

Assim: afetos líquidos que escapam ao nosso controle e produzem insatisfação, insegurança, medo, revolta, rejeição, auto-estima frágil e... Homogeneização das nossas práticas de relação conosco e com o outro!

Imaginemos uma solução sólida como sendo aquela cujos elementos afetivos são muito palpáveis... rígidos, duros, fixos e praticamente inalteráveis... inflexíveis. No caso do exemplo acima, seria como se definíssemos que estamos certos e o outro está errado e de que ele precisa se desculpar no tempo que “lhe demos” e na forma em que imaginamos, caso contrário... fim do diálogo. Ou, de que ele está certo e nós somos os eternos errados... de novo!

Assim, estereotipamos ações e leituras colocando de forma inapropriada dois pólos que estão conectados em situações de independência que não possuem.

Imaginemos uma solução gasosa como sendo aquela cujos elementos afetivos são voláteis, etéreos, e se retiram da nossa consciência e memória, para não dizer do nosso coração, num piscar de olhos. Ou, então, os elementos afetivos ficam completamente dissociados, pouco precisos... e não sujeitos à evocação na sua totalidade; lembramos só do que queremos e esquecemos a história, outros encontros e desencontros que tivemos com a pessoa e situação em questão. É como se disséssemos que “isso já aconteceu tantas vezes” e ele não muda, então o perdôo; ou, sou uma pessoa tão desapegada que posso dar a mão à palmatória e ser superior a isso... estamos repetindo nosso padrão gasoso de reagir de forma a não estabelecer conexões entre os acontecimentos... deixando ficar... volátil o que sentimos e pensamos de forma a evitar ações mais peremptórias.

Assim, relativizamos tudo e não respeitamos diferenças; ficamos apenas reagindo ao invés de agir!

Até aqui... misturas homogêneas.

E, se passarmos a falar em misturas... heterogêneas?

Isso, na química já não é mais uma solução! Mas para nós... continua sendo... possibilidades que podemos inventar, criar, experimentar, viver, nutrir e compartilhar, pelo menos com nós próprios, se deixarmos de fazer misturas emi e iminentemente homogêneas!

O conceito de “solução” dado na química aqui se traveste, se trans-forma num outro, mais comum e cotidiano, assim definido: soluções... “ações ou efeitos de solver; tempo; fim; desfecho; ação ou efeito de dissolver; resultado de problemas”.

Então cabe perguntar? Como temos resolvido nossos problemas, conflitos, dificuldades conosco próprios e com as pessoas com as quais nos relacionamos? Quais as soluções que temos achado? São homogêneas líquidas, sólidas, gasosas? São heterogêneas e permitem a diferenciação e composição com os nossos modos usuais de conduta e necessidades? Como e quais são?

Será que estamos associando forma com fôrma?
E será que estamos transformando a forma que damos às nossas soluções em fôrmas?

Neste sentido... podemos achar soluções heterogêneas e mistas... mistura de sólidas com líquidas, gasosas com líquidas e assim por diante... Soluções fluídicas e respirantes... que se oxigenam e “pegam ar” para dar sentido à própria experimentação e à nossa necessidade de adequação ao presente...

O título acima “Prazo de validade das soluções” convida a pensar e avaliar o “prazo”, “a validade”, as “soluções” na sua interconexão singular... e também, na sua generalidade específica.

Que prazo temos dado: curto, médio, longo? Todos os problemas tem prazo para se resolverem? De que jeito medimos esse tempo?

Qual a validade que damos aos acontecimentos, conflitos e problemas?

Validade permanente, impermanente, líquida (o quê está na minha mão e eu PEGO, antes que escoe?), sólida (tudo pode e deve ser resolvido agora? O que pode e deve ser resolvido agora... e o quê depois? Como?), gasosa (é definível a solução, o que dela evapora e nos escapa? em que termos?).

A solução parece-me o mais importante: que saída estamos encontrando para resolver nossos problemas? As mesmas? Quais mudaram? Estamos usando fórmulas novas, velhas para problemas novos, velhos?

Existe solução mesmo? Está na mão de quem a (as) solução (ões)? Na nossa? Na do outro? Nas mãos da dupla?

Será mesmo que a solução se dá por uma porta de “saída” dos problemas?

Ou, poderia ser por uma porta “de entrada” nos problemas?

Sim... porque, as vezes, queremos sair do que nem sabemos direito com está e ... queremos sair para não ver!

E, finalmente: como está e qual é o prazo de validade das soluções que estamos dando... encontrando na nossa vida?

Para finalizar: o que consideramos como solução para determinado problema ou conflito é mesmo uma solução? E o que consideramos como problema ou conflito são isso mesmo, problema ou conflito?

Exemplo pessoal: quando decidi ir à Índia pela primeira vez, sabia que queria ir sozinho, sem pacote turístico; e sabia que queria ir com alguém que fosse até lá comigo e depois seguisse seu rumo... ou alguém que já estivesse lá e eu pudesse obter o endereço... pontos de referência era o que eu queria!

Estudei e li tudo o que podia e encontrava e me vesti de referências sobre esse país tão “estranho” (estranho?) para mim.

Várias oportunidades apareceram, dentro das soluções que havia escolhido... todas deram errado: um monge que iria pela Europa... foi pela África do Sul; uma monja ia pela Europa, foi tranferida de continente... não saindo mais do Brasil e adiando sua ida à Índia por tempo indeterminado... um grupo de brasileiros que estavam lá, já não estaria mais quando eu chegaria... e assim por diante.

Estava quase desistindo (porque as soluções que havia escolhido não estavam dando certo e eu as considerava, mesmo, soluções), quando uma amiga me perguntou à queima roupa:

-Por que você não vai sozinho?

Resposta negativa... não havia cogitado essa hipótese... essa solução!
Me justifiquei... até perceber que essa era a solução.
Sim.....eu vou sozinho para a Índia!
E fui!
E foi maravilhoso!

Uma solução nova e inédita para um problema que eu considerava um problema... até ver que não era um problema.

Ponto. ...

E você?



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